Num desses dias em que o sol
apareceu no horizonte, forte como se fosse mil vezes mais esplendido do que o
normal, o galo acordou meio que de ressaca, mas sabia que tinha um trabalho
muito importante a fazer: dizer a todos os outros que já era hora de acordar.
Num salto, pôs-se de pé e andou ciscando até um lugar mais alto. Chegando ao
seu ponto estratégico, onde conseguiria um maior alcance com sua voz, ele se
deu uns tapas como se quisesse acordar do sono que ainda estava o possuindo.
Deu uns pulinhos, aqueceu os pés,
bateu um pouco as asas e se sentiu então pronto para realizar sua tarefa
diária. Mal sabia ele que há muito alguns tramavam algo contra ele, e aquele
sol lindo seria a deixa. Não poderiam ele ter aquele prazer de cantar para
aquela bela obra divina que aparecia ao horizonte. Ele não iria espalhar para
aqueles que estavam desacordados que aquela beleza toda estava ali para ser
deslumbrada. Não mesmo. Os touros, as vacas, e principalmente os equinos não
aguentavam mais aquela cantoria demasiada, por que já tinham passado da idade
de ficar contemplando aquelas novas formas que o sol fazia todos os dias no
horizonte. Estavam de saco cheio daquilo e não queriam deixar os pequenos perto
do galo, porque achavam que ele seria uma péssima influência para seus
rebentos.
Decidiram eles pegar o galo,
segurar pelo pescoço, e mantê-lo dentro de seus aposentos cagados até no feno. Ele
não suportava a ideia de que logo mais os outros acordariam e teriam perdido
tamanha beleza. Queria urgentemente avisá-los das tramas mirabolantes daqueles
animais grandes, velhos e egoístas. Porém, ele estava atado e ameaçado por
chifres, cheirando toda aquela merda que ficava ao redor daquele ambiente
escuro e monótono. Na verdade, ele não estava preso, mas sim coagido a não sair
dali. Não apertavam mais seu pescoço, só que aqueles olhares feiosos diziam que
ele não deveria fazer aquilo, a não ser que fosse um louco varrido. Por sorte,
ele era insano.
Num grito meio que bem bolado,
chamou a atenção de seus pintinhos e de seus outros colegas galos, que fizeram
questão de acordar todos os outros seres para que vissem o quão belo era aquela
obra que aparecia sinuosa no horizonte. Ficaram deslumbrados os que estavam
desacordados, alguns reclamaram de início, por terem dormido pouco, mas no final,
todos viram como eram magníficas aquelas linhas feitas pelo astro rei ao longe.
Os velhos animais de cascos não se sentiram nem um pouco confortáveis com
aquilo. Era como se seu querido silêncio tivesse sido abalado e trouxesse ecos
em seu lugar. Ecos para eles insuportáveis de admiração de uma coisa maior que o
silêncio barulhento que havia sido imposto por eles. O galo havia cumprido a
missão dele, e os filhotes dos animais do estábulo ficaram contentes com
aquilo. Estavam ali, cantando junto com o galo e os outros, todas aquelas
canções de quão fantástico era aquele momento. Aquilo nunca mais saiu de suas
memórias. E continuaram cantando até mesmo depois que o galo pôs-se a dormir de
vez.
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