Acordei no meio da manhã com o sol batendo forte na fresta da cortina. Sabia que era o meio da manhã porque a rua parecia agitada e barulhenta, como quando fica perto da hora do almoço e as pessoas começam a circular falando em seus celulares e se cumprimentando rapidamente com "Oi, como vai? Temos que nos encontrar qualquer dia desses! Tá sumid@. Até depois!" e somem no capinado até a próxima vez em que o destino (ou seja lá o que for) fizer com que se cruzem na rua de novo, para repetir o bordão.
O meu péssimo hábito de fechar as cortinas com esparadrapo e pregador para que o sol não me acorde cedo não deu totalmente certo. Estava acordado antes do horário que eu havia estipulado mentalmente e com o sentimento de que deveria ter dormido pelo menos mais umas 4 horas para dar conta de recarregar as baterias. Nisso também estão inclusas as baterias emocionais e espirituais para aguentar mais um dia com gente que não consigo nem olhar na cara por muito tempo. "Estou extremamente antipático no momento, ligue mais tarde e não deixe recado."
Apesar disso, continuei jogado na cama olhando para o teto (ou para o nada) numa posição parecida com a que o Gandalf ficou no momento de limbo entre O Cinzento e O Branco. Só que sem sentido algum. Só estava lá, estatelado, imaginando como a vida poderia ser diferente se eu, de repente, começasse a sair de casa e ver a natureza (extremamente solitário, como um samurai), contemplasse o dia, voltasse a fazer exercícios e mandasse uma banana pra cada babaca que viesse interromper minha vibe. Mas não. Chupar o dedo em casa parecia mais excitante para o vermelhinho que ficava me cutucando em um dos ombros.
Tudo bem. Até então eu não sabia que dava para fazer diferente apenas constatando que não tinha nada me impedindo e que "cada manhã tem uma lição para nos ensinar, por isso não voltes a dormir" (frase do Rumi para quem aperta o botão soneca, prevista há mais de 8 séculos, mas a humanidade não aprendeu ainda porque ninguém quer ler poesia persa que fala sobre amor).
Naquela manhã eu certamente não imaginava que teria surpresas inacreditáveis em pouco menos de uma semana (quem sabe até a próxima sexta-feira, que era o dia que eu mais aguardava, por considerar o início do final de semana e momento mais especial de todos na rotina). Então fiquei na cama até dar a hora do almoço. E depois dela. Até o momento em que já não daria mais para almoçar e teria que sair correndo para a aula. E ainda assim chegaria atrasado. Ou faltaria a primeira, quem sabe?
Na verdade isso tudo parecia uma ótima ideia, inclusive para se repetir várias vezes na semana, mas estava acabando comigo, principalmente por ação do vermelhinho e pelo choro do de auréola que ficava do outro lado. Mas é que eu não sentia minhas forças mesmo. E, dia após dia, parecia cada vez mais distante o dia em que me vi na minha melhor forma e interativo.
Não, certamente não sabia se queria consolo ou se queria afastar o restinho de atenção que recebia para viver como lobo solitário e viver daquilo que a natureza tinha para me oferecer. Só sabia que aquele momento estava sacudindo as minhas estruturas e me botando no buraco.
Mas o que vim a aprender depois sobre esse momento foi ainda mais intrigante. O que acontece com a lagarta quando se enfia no casulo? Já se perguntou?
(Este texto faz parte de uma obra ainda em produção, baseada em fatos (ir)reais. Vou publicar algumas prévias como esta de vez em quando. Me ajudem com o feedback!)
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